Total de visualizações de página

quarta-feira, 7 de novembro de 2012

Cap. 17 - O terceiro dia

Acordamos BEM TARDE naquele terceiro dia: cerca de cinco e meia da manhã!!! Foi muito bom para dormir um pouco mais. O astral ficou mais leve assim. A recepção do pessoal de Traipu foi muito boa - um café da manhã para muita gente circulando por ali que eu nem conhecia e que foi muito rápido. Eu mesmo cheguei meio atrasado e não deu para comer adequadamente.
Arrumamos os mantimentos preparados no dia anterior - eu e o Fabio por aqui e o Alê por lá - e fomos atrás do gelo solicitado ao pessoal em terra. Aconteceu que, desta vez, o assistente da prefeitura não conseguiu trazê-lo e ficamos sem gelo. É a profecia mais uma vez: do que adianta a cidade se dizer pescadora se o gelo não chega a tempo para nossa largada? Por sorte nossa, havia duas pedras grandes de gelo no freezer que repartimos - uma para a minha mala térmica e outra para a do Fabio. Mas a temperatura da malto naquele dia estaria comprometida, com certeza.
Antes de sair, a decisão que deveria ser tomada na noite anterior ainda estava pendente. Quem iria nadar junto com quem? O Foschini sugeriu que ele iria nadar com o Alessandro e os outros três deveriam formar o segundo grupo.
Era mais que óbvio que esse esquema não iria funcionar, pois o ritmo de nado dos dois - Foschini e Alessandro - eram muito diferentes entre si. Eu tentei contra-argumentar, mas não havia clima para discussão: a equipe estava dividida - naquela altura do campeonato, o Foschini só não havia discutido com o Alessandro. Com  base nessa divisão, repartimos as maltos entre os dois barcos - novamente teríamos um da prefeitura e um dos Bombeiros para estar de acordo com os nadadores que seriam acompanhados.
Nossa largada naquele dia foi bastante festiva - tiramos fotos com nossos anfitriões, o sol já brilhava forte, o astral da cidade era muito positivo.

Nossas simpáticas anfitriãs de Traipu com nossos inseparáveis amigos Bombeiros.

"É nóis na fita", com nossos anfitriões de Traipu, momentos antes da largada.

Novamente entramos naquela imensidão de rio, em direção ao infinito. O bom de se fazer uma travessia de grande monta é isso: você começa a nadar e não vê o final. Tudo o que você sabe é que ele está muito longe!
Esse trajeto prometia ser mais fácil que no dia anterior - nada seria pior, eu posso afirmar. Mesmo assim, sabíamos que alguns maretões seriam inevitáveis. Nosso objetivo: a cidade de Porto Real do Colégio, situava-se 33 km  rio abaixo.
A cidade leva este nome por que ela recebeu a visita do Imperador D. Pedro II em sua excursão pelo São Francisco lá pelos idos de 1859, isto é, há algumas poucas semanas atrás. Rsrsrs.
Entramos na água com o pesar de uma despedida. A recepção e a estadia que nos foram oferecidas foram simplesmente inesquecíveis. Levaremos ótimas lembranças da cidade. Como se vê na foto acima, às sete da manhã o sol já brilhava forte. Iniciamos nossas braçadas lentamente até estabelecermos um ritmo de prova - aquele ritmo que o nadador é capaz de manter por horas a fio dentro de uma estabilidade de seu condicionamento físico.
Nesta região, o Rio São Francisco já era bem mais raso, não havia corredeiras nem redemoinhos, mas os maretões estariam por lá - já nos haviam avisado sobre a inevitabilidade de encontrá-los no meio do caminho. Em vários pontos, o rio mostrava sua vastidão, abrindo suas margens ao passo que avançávamos.
Assim seguimos nadando - na configuração inicialmente proposta - o Alessandro e o Foschini vinham um pouco atrás, não mais do que uns cem ou duzentos metros.
Nos raros momentos em que estávamos todos juntos, a parada para alimentação era uma verdadeira festa, no sentido literal da palavra. Eu me mantive fiel à minha dieta de malto, assim como o Fabio também. Mas, depois da malto, comer um docinho ou um pêssego em calda não fazia mal a ninguém. Eu provei um de cada - não mais do que isso. O Foschini comia os docinhos de mão cheia - enfiava a mão no pote e, quantos saíssem ele comia.
O mais curioso e motivo de muitas risadas no grupo era a ginástica toda que tínhamos de fazer para ficarmos juntos ao barco. Nós nos agarrávamos a ele como podíamos e éramos arrastados pelo atrito com a água - parte pela correnteza, parte por sua motorização.

Aproveitávamos o momento para "retocar a maquiagem", isto é, passávamos um pouco de protetor solar no rosto ou, como se vê o Alessandro na foto acima, usávamos Hipoglós também com esta função. (Não, ele não está enfiando o dedo no nariz, pessoal!)

Como de costume, começou a ventar entre 9 e 10 horas da manhã e os maretões se apresentaram. Neste momento eu estava ao lado do Fabio, que espontaneamente falou:
- Oba! Lá vêm as ondas. Hora de ondular. Vamos ondular, pessoal!
Foi muito bom ouvir aquilo, por que numa única palavra - ONDULAR - ele conseguiu demonstrar a técnica a utilizar para se reduzir - nunca eliminar - os problemas para nadar em meio a ondas intensas. E assim o fiz. Percebi que o ritmo que eu ondulava deveria estar em consonância com a frequência das ondas que chegavam.
Eu já havia tomado aulas com o Agnaldo - meu técnico em minha Travessia do Canal da Mancha - e também com o Glauco Rangel - experiente nadador de águas abetas -, mas nunca havia conseguido transformar seus conselhos em  menor atrito com as ondas. Ali no Velho Chico eu consegui descomplicar e ondular.
O rendimento aumentou - estava muito mais fácil pelo aprendizado e pelos maretões, que foram mais comportados neste dia. O rio mostrava-se mais sinuoso. Uma curva aqui, outra ali, uma ilha no meio, algas em vários pontos.
Como a água estava bastante mexida, fica mais difícil de acompanhar visualmente a posição de todos os colegas. Assim, o Fabio e o Tarzan se descolaram de mim na segunda metade da prova. O Foschini, que vinha atrás com o Alessandro, passou por mim e seguiu firme em frente. Eu reduzi o ritmo, aguardei o Alessandro, que logo se achegou e fomos nadando juntos até o final.
Mais uma vez nossos mantimentos, que estavam divididos de um jeito entre os dois barcos, passaram a ser distribuídos aos nadadores em momentos diferentes. Eu podia ver que o Foschini, o Fabio e o Tarzan estavam bem à frente pela posição do barco que os acompanhava - era o barco grande da prefeitura de Traipu. Conosco seguiam os bombeiros. Minha malto estava no barco à frente, que de tempos em tempos tinha que voltar para me alimentar. Ainda bem que as distâncias naquele dia eram as menores, senão poderíamos ter problemas maiores.
Nos últimos dez quilômetros de prova, perdemos o contato visual com os três que estavam à frente. Havia algo ali que os motivava a nadar mais rápido e que eu não conseguia entender. Eu e o Alessandro mantivemos nosso ritmo.
Próximo à chegada em Porto Real havia uma ilha que dividia o rio em duas metades. Não sabíamos ao certo de que lado entrar. Fomos pela direita e logo o barco dos Bombeiros veio nos avisar que seria melhor irmos pelo outro lado, pois a entrada da cidade estava se aproximando. Nadamos subindo o rio uma centena de metros para poder contornar a ilha e voltamos a encontrar o leito do rio forrado com aquelas algas espessas que não nos davam espaço para nadar. Era uma sensação horrorosa, nadávamos para lá e para cá em busca de um canal de água sem algas, mas a região era infestada com os rabos-de-raposa.
A entrada da cidade estava a uns quinhentos metros de distância e já percebíamos um ou outro barco diferente dos nossos circulando nas redondezas. Motivo de atenção redobrada para nossos amigos da Marinha e os Bombeiros, sempre preocupados com nossa segurança.
Quando chegamos à cidade, havia uma pequena rampa de concreto com um degrau submerso que nos conduzia a uma grande área cimentada onde nos esperavam um sem número de pessoas e as autoridades locais - aí inclui-se também a prefeita da cidade. Os últimos metros, só para brincar, eu nadei no estilo borboleta.
Havia uma multidão ali à nossa espera. Enquanto o povo queria prestar-nos uma pequena homenagem e combinar o local onde faríamos um belo almoço, meus pés ardiam no calor do cimento e a situação estava ficando difícil de suportar. Ao mesmo tempo, tínhamos que dar atenção aos nossos anfitriões e resistir bravamente à temperatura local. Quando o grande barco finalmente aportou, pedimos ao Eugênio, que cuidava de nossas coisas, que nos trouxesse os chinelos para aliviar o problema. São pequenas coisas que podem ter um grande impacto na hora H.
Após mais de hora de cumprimentos, arrumação e ordenamento das ideias torrando sob o forte sol do São Francisco, fomos conduzidos à nossa pousada, onde pudemos tomar banho e almoçar junto aos nossos anfitriões.

Calorosa recepção em nosso almoço ao chegarmos em Porto Real do Colégio.

Foi o primeiro dia em que tivemos tempo para descansar um pouco mais. Terminamos o almoço depois das 16 horas e estávamos liberados para nossa preparação para o último dia.

2 comentários:

  1. O 3º dia para mim foi crítico, realmente não conseguiu acompanhar o Edmundo (fui pretencioso, é lógico que não conseguiria...), e entre a escapada dele e a "espera" do Percival fiquei um bom tempo a "deriva" sem se alimentar, esse inconveniente aliado ao fato de não ter caprichado no café da manhã, eu nadei muito mal. Não culpo o Edmundo por ter nadado sozinho e agradeço ao Percival por ter me esperado. Agora com relação aos rabo-de-raposa, é extremamente desagradável, tem horas que nossa criatividade nos leva a imaginar coisas horrorosas que possam estar lá embaixo...

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Alê, eu só encostei em você quando percebi que você estava sozinho. Os bombeiros me avisaram.
      Sobre os rabos-de-raposa, acho que os rabos-de-foguete que tivemos que superar foram bem piores. Rsrsrs

      Excluir